quinta-feira, 8 de abril de 2010

Diálogo

Carlos Antônio Baccelli - Uberaba MG

Conta-se que, certa vez, o cérebro cansado de brilhar por entre títulos e glórias, angustiado e insatisfeito com o mundo que construiu para si mesmo, esforçando-se por libertar-se dos próprios preconceitos e fazendo silêncio no mundo mecânico de seus cálculos, retirou-se de casa e, descendo a desmanchar-se em lágrimas e soluços de sofrimentos, tomou o caminho da humildade, a fim de dialogar com o coração.
“Sr. Coração, - disse o Cérebro, entre vergonhoso e triste. Desejo saber o que existe de errado comigo. Durante milênios venho trabalhando pacientemente por um mundo melhor para o homem. Tenho lutado no campo da engenharia, construindo palácios, monumentos e formas arquitetônicas arrojadas, que têm desafiado a poeira dos tempos. Mas, por mais que tenha feito para livrar o homem das intempéries e protege-lo contra as ciladas da vida, ainda não consegui banir do mundo a miséria daqueles que não possuem uma pedra onde repousar a cabeça...
Sou instrumento de várias conquistas no campo da medicina, mas existem ainda, no mundo aqueles que choram, encontrando consolo tão somente nas próprias chagas que ostentam no peito, como rosas de sangue...
Sentindo que o homem vivia isolado e triste, dei-lhe o telégrafo e a televisão, o telefone e o rádio, mas não sei explicar porque ainda existem, na Terra, aqueles que trombam entre si, sem sequer trocar um simples cumprimento...
Desejando dar ao homem um campo de ação mais amplo, orientei-o para que vencesse a barreira da distância e auxiliei-o a conquistar outras estrelas, mas não encontro justificativa honesta que me esclareça quanto aos motivos da guerra e da destruição”.
E o Cérebro, consumindo-se em lágrimas e, pela primeira vez colocando-se abaixo do Coração, ajoelhou-se e suplicou com suas últimas reservas de forças: “Por quem és, não me abandones à própria infelicidade! Suplico-te em nome Daquele que um dia, usando-me, os homens penduraram numa cruz! Ajuda-me...”
O Coração, abaixando-se, levantou o Cérebro da poça de lágrimas onde se afogava e exclamou:
“Irmão! Chama-me irmão! Há muito venho endereçando-te os mais ardentes apelos para que, embora subindo, não esqueças que trazes, ainda, os pés chumbados ao solo. Suplicava-te para que não esquecesses que toda realização no campo da inteligência deve apoiar-se na base do sentimento, mas estavas muito alto para ouvir-me... E, como nada mais era possível fazer, orava no silêncio da minha dor, para que um dia reconhecesses que eu e você, irmão, somos almas gêmeas criadas por Deus para caminhar juntas.
Em verdade, agiste revestido das mais nobres intenções, mas não te lembraste de que, se te cabe criar a Vida, cabe a mim sustenta-la com Amor. Fertilizaste, é verdade, terras estéreis, mas não conseguiste adubar o sentimento. Construíste maravilhas, mas não pudeste erguer o homem para o Amor. Trabalhaste no campo da Química e conseguiste maravilhas invejáveis, mas não tiveste condições de criar um composto de paz, reagindo a Alegria com a Fraternidade. Subiste e conquistaste novos céus, mas não soubeste descer para conquistar-me...
Minhas palavras não estão revestidas de acusações, mas não posso agora negar-te a caridade da verdade. É preciso colorir o mundo preto e branco que construíste. É indispensável fazer o uso do pincel do Amor e ceder às tintas da Paz e do Bem, da Bondade e do Perdão, da Fé e da Esperança e rogar ao Pai que me permita trabalhar. Vem comigo, dá-me tua mão e chores mais.
Escolta-me nesta jornada que devo empreender em teu mundo. Leva-me aonde se oculta a dor e permita-me repartir o Amor. Mostra-me o esconderijo da infelicidade e consente-me multiplicar a esperança. Conduz-me ao abismo da guerra e facilita-me a distribuição da paz. Deixa que a minha voz, através da oração, perfume o mundo inodoro que idealizaste. Permita-me polvilhar, com oásis de Alegrias o deserto de tristezas dos teus sonhos...”.
Narra-se ainda que, por isso, onde fulgure o Cérebro nos pedestais da glória, Jesus ascende no Coração humano, diminuto raio de luz, à guisa de batedor das conquistas da inteligência, para que, por onde trilhe a cultura, o sentimento discipline e oriente a vitória.
Pensar não basta: é preciso sentir. Pensando o homem transformou a face da Terra, mas, sentindo, Jesus transformará o homem.

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